41ª. SESSÃO SOLENE DA 4ª. SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA IX LEGISLATURA.

 


Em 7 de outubro de 1986.

Presidida pelo Sr. André Forster - Presidente.

Secretariada pelo Sr. Mendes Ribeiro - Secretário “ad hoc”.

Às 14h45min, o Sr. André Forster assume a Presidência.

 

 


O SR. PRESIDENTE: Havendo número legal, declarado abertos os trabalhos da presente Sessão Solene, destinada à entrega do título honorífico de Cidadão Emérito ao Sr. Antônio Augusto Fagundes.

Solicito aos Líderes de Bancada que conduzam ao Plenário as autoridades e personalidades convidadas.

Convido a tomarem assento à Mesa: Dr. Euclides Fagundes Filho, Diretor de Planejamento da EPATUR, representando o Sr. Prefeito Municipal; Dr. Lourenço Ardenghi Filho, Prefeito Municipal de Palmeira das Missões; Dr. Karl Heinz Kopitke, Prefeito Municipal de Campo Bom; Dr. Antônio Salomão, Secretário da Administração de Alegrete, neste ato representando o Sr. Prefeito Municipal de Alegrete; Sr. Antônio Augusto Fagundes, homenageado; Dr. Aneci Antunes da Silva, Presidente do Guaíba Country Club.

Falarão, pelas Bancadas do PDT e PSB e na condição de autor da proposição, o Ver. Pedro Ruas; pela Bancada do PMDB, o Ver. Clóvis Brum; pela Bancada do PDS, o Ver Hermes Dutra; na condição de Independente, o Ver. Jorge Goularte, e, pela Bancada do PCB, o Ver. Lauro Hagemann.

Com a palavra, o Ver. Pedro Ruas, pela Bancada do PDT e PSB e na condição de autor da proposição.

 

O SR. PEDRO RUAS: Sr. Presidente, Srs. Vereadores. Porto Alegre hoje vive um dia especial na medida em que o homenageia, através desta Casa, um dos maiores talentos de que tem notícia a história recente do Rio Grande do Sul. Falar sobre Antônio Augusto Fagundes é falar sobre a própria cultura gaúcha.

Homem dedicado ao estudo e à divulgação de nosso nativismo, Antônio Augusto Fagundes atuou e atua em praticamente todos os níveis de atividade que tenham relação com o tradicionalismo rio-grandense, seja como professor de folclore, apresentador de “shows”, declamador, cineasta, figurinista, dançarino, historiador, compositor, escritor, jornalista e apresentador de rádio e televisão.

O grande folclorista iniciou seus estudos em Porto Alegre em 1954, estudando nos colégios Júlio de Castilhos e Rui Barbosa. Em 1964, concluiu o curso de Direito na UFRGS, exercendo, a partir de então, a advocacia nesta Capital. Ainda na UFRGS, concluiu seu primeiro curso em nível de pós-graduação em História do Rio Grande do Sul, ingressando, mais tarde, no curso de pós-graduação de Antropologia Social, quando defendeu a tese para a conclusão de mestrado com a dissertação que tem por título “Santas Prostitutas”. Bem antes disso, Antônio Augusto Fagundes já representava Porto Alegre, o Rio Grande do Sul e o Brasil em viagens pelo Uruguai e Argentina, já especializado em danças folclóricas de nossa gente. Tradicionalista, desde a infância teve em sua origem humilde os primeiros conhecimentos da forma de vida do gaúcho do interior do Estado, homem mais ligado aos hábitos e costumes gauchescos que os habitantes dos maiores centros urbanos, por contingências culturais e sociais já muitas vezes estudadas. Foram tais conhecimentos e tal vivência que lhe despertaram a paixão pelo profundo conhecimento da nossa história e pela divulgação da nossa cultura em todas as formas pela qual ela pode ser expressa.

Além das viagens por todo o Brasil e América Latina, Antônio Augusto Fagundes mostrou seu trabalho por quatro vezes na Europa e uma nos Estados Unidos, sempre com o brilho e o entusiasmo de quem acredita no seu povo e nas suas realizações. Reconhecido nacional e internacionalmente por seus méritos, é membro de incontáveis academias e institutos culturais, sendo premiado inúmeras vezes como autor de teses. Sua biografia consta de enciclopédias de autores do Rio Grande do Sul, e livros escritos no Brasil e Argentina lhe fazem dedicatórias enaltecedoras. Munícipe ilustrado de Porto Alegre, Antônio Augusto Fagundes desenvolve há mais de trinta anos o seu trabalho na Capital do Estado, cuja cultura é a sua própria razão de existir.

Filho do velho Euclides Fagundes e da Dona Mocita, aprendeu com seus pais o orgulho de ser gaúcho e, juntamente com seus nove irmãos, a importância do aprendizado e da divulgação do motivo de seu orgulho, na mesma linha que já inspirou tantos homens e comunidades, desde os Farrapos até os dias de hoje. Casado com a Dra. Marlene Nahas Fagundes, é pai de cinco porto-alegrenses, que certamente seguirão seu caminho de amar esta Cidade e este Estado. Esse é o perfil de nosso homenageado.

O menino do Inhanduy é hoje Cidadão Emérito de Porto Alegre, e a justiça dessa homenagem é observada também na unanimidade com que a mesma foi aprovada nesta Casa. Esta não é a primeira e nem será a última homenagem que se presta a esse grande gaúcho, orgulho de seus amigos, parentes, rio-grandenses e brasileiros. Outras virão, e todas merecidas. Esta, porém, é a homenagem da Cidade de Porto Alegre, e para nós, Vereadores, que representamos o povo da Capital, ela é muitíssimo importante. Porto Alegre hoje homenageia quem dedicou toda sua vida a homenagear o Rio Grande.

Siga seu trabalho, Dr. Antônio Augusto Fagundes. O título que hoje lhe é conferido é a demonstração de que existe reconhecimento da comunidade que acompanha sua trajetória, e a presença, nesta Sessão, de pessoas tão ilustres confirma a justiça da homenagem que, sabemos, é acompanhada também com orgulho, estejam onde estiverem, pelo velho Euclides e pelo mano velho Darci Fagundes. Muito obrigado.

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra, o Ver. Clóvis Brum pela Bancada do PMDB.

 

O SR. CLÓVIS BRUM: Sr. Presidente, Srs. Vereadores, demais presentes, foi muito feliz a iniciativa do Ver. Pedro Ruas porque resgata, por assim dizer, um momento de profunda gratidão da bicentenária Câmara Municipal de Porto Alegre para com o homem - e me perdoe, meu caro Vereador Pedro Ruas - que não só homenageia o Rio Grande, mas que vive pelas coisas do Rio Grande, que defende as coisas do nosso Estado, o homem que representa a alma, o pensamento, o sentimento do povo rio-grandense nas suas coisas mais lindas: a sua origem, o seu folclore, as suas tradições. E, com sua iniciativa, Ver. Pedro Ruas, a Câmara de Porto Alegre, por unanimidade, homenageia Antônio Augusto num sinal de reconhecimento pelo seu grandioso trabalho, pela sua grandiosa obra em defesa do nosso Estado, das suas tradições e da sua cultura.

Deveria preparar um discurso por escrito, mas me dizia o Ver. Luiz Braz: “Ver. Clóvis Brum, para saudar Antônio Augusto nem se deve escrever.” Falar em Antônio Augusto é falar do Rio Grande, do seu povo, do seu coração e da sua alma. E falar em Fagundes, então, para mim é um sentimento de ternura redobrada. Aos meus quatorze anos de idade, o meu primeiro trabalho político foi, como menino, fazer a campanha do Aldo para Vice-Prefeito de Alegrete. Aliás, Aldo havia me internado na Escola Agrícola lá de Passo Novo, meu caro Secretário. Dali foi permanente a convivência com a família Fagundes: Rui, a Neita, todos eles se somaram, se multiplicaram, por assim dizer, como os meus mestres. Quando eu o homenageio em nome do PMDB, partido a que pertence Antônio Augusto, eu me sinto honrado por estar representando a Bancada de Vereadores do seu partido, Dr. Antônio Augusto, neste ato tão importante para o Rio Grande, para Porto Alegre, parta a família Fagundes e para o tradicionalismo rio-grandense.

Há poucos conversávamos no gabinete do Ver. André Forster e discutíamos que reunião extraordinária era esta de hoje, quando homens e mulheres de quase todos os partidos políticos estão aqui, reunidos, em torno de uma causa comum, de um homem, de uma idéia, de uma cultura, de um pensamento, de uma obra, que é Antônio Augusto Fagundes.

A família Fagundes tem dado ao Rio Grande do Sul uma contribuição grandiosa não só pelo que o Aldo Fagundes representou, pelo que Antônio Augusto representa, pelo que o Ver. Pedro Ruas representa, pelo que o Antônio Fagundes Filho representa, mas porque todos se somam, se valorizam. E dizia o Ver. Pedro Ruas outro dia: “Estou constrangido de apresentar este Projeto.” Vim à tribuna e defendi o Projeto, que não precisava ser defendido porque achava que o Ver. Pedro Ruas, em nome da Cidade, tomava a iniciativa mais acertada de homenagear Antônio Augusto. Uma Câmara bicentenária, que se confunde com a própria História do Rio Grande, a primeira. Assembléia Legislativa da Província do Rio Grande do Sul, que é a nossa Câmara, homenagear em homem que se dedica à cultura rio-grandense é um ato, digamos assim, de justiça e de reconhecimento.

Por isso o PMDB se associa à iniciativa do Ver. Pedro Ruas e tributa-lhe, nesta oportunidade, sua homenagem de reconhecimento e diz que está muito feliz por ver o “guri do Alegrete” como Cidadão Emérito da Capital do Rio Grande do Sul. Muito obrigado.

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra, o Ver. Hermes Dutra pela Bancada do PDS.

 

O SR. HERMES DUTRA: Sr. Presidente, Srs. Vereadores, nosso caro Antônio Augusto, a homenagem que a Câmara de Vereadores faz hoje, outorgando-lhe o título honorífico de Cidadão Emérito, transcende em muito a feliz iniciativa que teve o Ver. Pedro Ruas, num momento de rara inspiração e felicidade, de propor, nesta Casa, a concessão deste título, sujeitando-se, inclusive, meu caro Antônio Augusto, a críticas, posto que num período eleitoral não é comum tecer-se louvores aos que não são do nosso partido. Mas o Ver. Pedro Ruas, em nome dos valores que o ilustre homenageado representa, não teve dúvidas em trazer a esta Casa a oportunidade de homenagear o Antônio Augusto, uma homenagem que transcende a pessoa do Antônio Augusto, uma homenagem que transcende ao político, uma homenagem que transcende ao professor, ao advogado e ao divulgador. É uma homenagem, sobretudo, ao homem do Rio Grande, ao homem do Rio Grande nascido no Interior, criado dentro dos parâmetros da nossa formação pampeana, alargado como os horizontes, tais quais as coxilhas da Campanha. Na verdade, esta homenagem representa o que esta Cidade é. Esta Cidade de Porto Alegre é composta de homens do interior do Estado, sequiosos pela sua terra, loucos de saudade e que se atropelam a cada exposição de animais que há lá em Esteio, como numa busca invisível e incansável do cheiro do interior do Estado.

Esta Casa é a própria corporificação da Cidade, meu caro Antônio Augusto, e, ao homenageá-lo, o faz convicta de que os valores do Rio Grande, quanto mais e mais se possam deles duvidar, mais e mais se parabenizam, e diariamente, felizmente, assistimos e ouvimos mais pessoas se associarem a este batalhão de gente que não tem vergonha de dizer que é gaúcha e que não se admira mais quando vê alguém andar pilchado. Aliás, a propósito disso, como iniciou a música do irmão do Antônio Augusto quando se referia ao Alegrete, diz: “Não me perguntes onde fica o Alegrete...” Se alguém perguntar onde anda o Antônio Augusto, basta dizer que se procure alguém pilchado de lenço branco e de vez em quando com mala na garupa ou no ombro. De lenço branco que, no dizer de Jayme Caetano Braun, significava “branco como a alvorada pampiana/ e que ao se dobrar, soberana/ revela quando esvoaça/ toda a nobreza da raça/ que no esvoejar se retrata e até parece que relata/ coragem e desassombro/ quando no trono de um ombro/ estendido te desatas.”

Mas a homenagem a Antônio Augusto representa fundamentalmente a homenagem ao homem do Interior, àquele que veio para a Capital e entrou em choque com a civilização moderna, o cosmopolitismo da Capital, e vê os seus valores de honestidade, lealdade, de amor ao próximo, de palavras, muitas vezes entrarem em choque. Lembro-me do meu velho pai, vindo dali do outro lado da tua terra, do Cacequi. Quando chegou aqui, em Porto Alegre, louco de faceiro, passou alguém pela frente da modesta casa onde foi morar e propôs um negócio: “Me vende esses restos de material que sobrou que eu te trago verdura por suas semanas.” O velho, na hora, entregou o material e está esperando as verduras até hoje. Eu lhe disse: “Pai, aqui não é Cacequi: aqui é Porto Alegre, a selva de pedra, onde as pessoas não têm tempo, onde as pessoas andam e se dão conta que há um amigo na sua frente quando pecham nele na Rua da Praia, onde, infelizmente, só se vive para ganhar o dia de amanhã e onde raramente se tem tempo para estender a mão com uma cuia para oferecer um chimarrão.”

Então, esta homenagem, Antônio Augusto, tem muito de nós, daquilo que somos, de homens do Interior. E que dizer da representação que tem o nosso ilustre homenageado? Eu ouvi uma música, dias atrás, que concorreu num dos festivais da canção nativa e que falava “sou herdeiro de Sepé, retemperado na guerra”. Ouvindo a música, lembrei-me da Sessão onde teria que falar por deferência muito especial dos meus companheiros de Bancada, os Vereadores Rafael Santos e Mano José, que me cederam a honra e o direito de vir hoje homenageá-lo nesta tarde. Lembrei-me, Antônio Augusto, que essa frase caía bem. Você é um herdeiro de Sepé, mas não é um herdeiro de Sepé somente. Você encarna a herança de Sepé, a herança de Bento Gonçalves, a herança de Davi Canabarro, a herança de Garibaldi - “herói de dois mundos” -, e tantos outros, como Domingos José de Almeida, que nem gaúcho era, que veio das Minas para empapar as coxilhas do Rio Grande com sangue mineiro em defesa de uma revolução que entendíamos como justa e cujos valores ainda persistem até os dias de hoje. Então, esta homenagem, Antônio Augusto, representa a homenagem ao homem, que todos nós somos, do Interior, a homenagem ao professor, ao estudioso divulgador das coisas do Rio Grande que você é, ao político que você representa, e não vejo por que, aqui, de não fazer comercial para a sua candidatura, longe disso, mas sim lhe dizer que o Rio Grande precisa mandar, efetivamente, para o Congresso homens ligados a coisas do Rio Grande para que mostrem, lá, que o Rio Grande não é o que dizem por aí, que aqui se usa bota e bombacha por gosto, porque é bonito e nos sentimos bem assim. E é importante que esses valores sejam encaminhados ao Congresso Nacional. Esta homenagem representa também a obrigação da Cidade de Porto Alegre com as coisas do Rio Grande, posto que a obrigação de cada um de nós, em particular, e de todos nós, em conjunto, é de dizer ao País e ao mundo dos nossos homens, que possuem seus valores e que os defendem.

Não quero que este discurso se prolongue até porque falo a um membro de uma família de gaudérios, os Fagundes. E quem não os conhece? Quando guri, eu ouvia a PRH2, meio fanhosa, no domingo à noite, do saudoso mano, o Darci Fagundes, com o seu “Rodeio Coringa”. Mais tarde, nas andanças pelos jornais, rádios e canais de televisão, aprendi a conhecer a metade da família, pois é uma família muito grande, “que nem esperança de pobre”, mas a metade eu conheci nesta andança - políticos, cantores, compositores, que certamente enchem de muita honra e orgulho seus pais. Portanto, Antônio Augusto, receba o abraço, o quebra-costela bem chinchado da Bancada do PDS.

Por derradeiro, fico a imaginar como se sente o homem lá de Alegrete enfiado na Capital do Estado, no burburinho diário... Fico a me lembrar que, de repente, quando o sol se esconde por entre a vegetação meio escassa do Parque Marinha e tal qual uma bola de fogo meio alaranjada se esconde no horizonte, acho que tu deves te lembrar do teu Alegrete. Acho que tu lembras do Inhanduí, do rio Ibirapuitã, onde, certamente, bebeste água, já que se diz lá que “quem bebe água desse rio se torna grande”. Deves ter bebido muita água desse rio.

Para encerrar, quero buscar nos versos do teu irmão, Antônio Augusto, novamente o fecho deste modesto e despretensioso discurso no que há de mais belo, de torrente de poesia sobre o Alegrete, a tua amada terra: “Que na hora derradeira, que eu mereça ver o sol alegretense entardecer; como os potros, vou virar minha cabeça para os pagos no momento de morrer.” Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra, o Ver. Jorge Goularte, independente nesta Casa.

 

O SR. JORGE GOULARTE: Sr. Presidente, Srs. Vereadores, demais componentes da Mesa, meu  querido homenageado, pois vem falar, meu irmão, um homem sem partido, que há um ano está sem partido. Se faço esta homenagem, é a primeira vez que falo nesta Casa por uma concessão da Mesa, porque apenas falam Vereadores colegas que têm siglas partidárias. Não poderia me omitir e espero que o meu querido amigo, que tanto tem dado pelo nosso Estado, possa ser um representante do Rio Grande na Câmara Federal. Esta Casa dá o exemplo ao receber um gaúcho pilchado, e espero que ele não tenha dificuldades na Câmara Federal.

É natural que, ao falar ao meu amigo Antônio Augusto, eu o faça de coração, sem nada ler, apenas com o pensamento, porque o Antônio Augusto ficou sendo um desses índios que se encontram nos galpões e, ao redor dos fogões, falam aos moços com paciência do querer da querência, ao longo dos corredores, alegrias e dissabores vividos pela existência. É um caboclo de qualidade. Por isso que é muito fácil, como disse o Ver. Clóvis Brum, homenagear-te. Foi uma votação que fizemos com prazer e, por ser unânime a votação, nós tivemos uma satisfação ainda maior.

Eram apenas essas as palavras que eu queria te dizer, desejando-te felicidades nesta jornada comprida que estás fazendo pelo Rio Grande. Que alcances o teu ideal para o bem de todos nós, gaúchos autênticos do Rio Grande. E eu vejo ali o meu querido amigo Bagre - para mim, o meu querido companheiro Bagre, pois já tivemos algumas broncas por este Rio Grande e por este Brasil. Eu lembro que, em Vitória, tivemos que nos colocar costa com costa para que não apanhasse um só. Então, nós ficamos juntos para que apanhássemos os dois, e os paulistas recuaram, porque o gaúcho não estava só - tinha companheiro junto. Por isso, Antônio Augusto, eu gostaria de relembrar, nesta oportunidade, o Darci Fagundes, o Gildo de Freitas, o Glauco Saraiva, o José Mendes, o Teixeirinha e tantos outros gaúchos que estão vivendo na estância grande do céu, decerto engraxando algum suvel para o patrão velho buenacho, porque Deus nos levou gente buena, e, neste momento, me desculpando pela solicitação, eu pediria à Mesa que fizesse a bondade de nos dar um minuto de silêncio para que nós prestássemos uma homenagem póstuma ao teu irmão, o meu amigo Darci, em relação ao qual estou propondo um projeto para dar nome de rua em Porto Alegre.

Para homenagear o Darci e para homenagear todos esses gaúchos que já partiram para a estância grande do céu, eu pediria ao Presidente que controlasse um minuto de silêncio.

 

(É feito um minuto de silêncio.)

 

Para encerrar, Sr. Presidente, gostaria de dizer como Alceu Wamosy: “Se há nesta vida um Deus para os acasos,/ e pela humanidade o bem reparte,/ que dê da fortuna a melhor parte;/ que venturas te dê sem leis, sem prazos.” Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra, o Ver. Lauro Hagemann pelo PCB.

 

O SR. LAURO HAGEMANN: Sr. Presidente, Srs. Vereadores, meu prezado companheiro Dr. Antônio Augusto Fagundes, nosso homenageado, senhoras e senhores presentes, o PCB não poderia estar ausente desta homenagem que a Câmara Municipal de Porto Alegre presta a um dos cidadãos deste Estado. É um dos mais legítimos representantes do humanismo telúrico rio-grandense. Sua participação na vida pública rio-grandense é inquestionável e já foi relatada. Em nome desse humanismo, permito-me recordar algumas passagens que temos vivido juntos.

Ligam-me à família Fagundes laços muito profundos de amizade e respeito. Lembro-me de Antônio Augusto Fagundes na Divisão de Cultura da SEC, no Instituto de Folclore e Tradições, junto com o Dr. Carlos Krebs. Lembro-me de Antônio Augusto meu vizinho na Tomás Flores, com Dona Marlene e a criançada que aqui se faz presente, hoje bastante adulta. Lembro-me de Antônio Fagundes no rádio e TV, meu companheiro de tantas lutas. Tudo isso é o bastante para que a Cidade de Porto Alegre se sinta honrada em ter hoje esse seu filho representante da dignidade. Esta homenagem, que a Cidade presta aos seus cidadãos mais ilustres, que vêm de todos os recantos do Estado onde exercem suas atividades, constróem suas famílias, é, para todos nós, motivo de grande satisfação e que ainda está para se concretizar: o transformar esta Cidade num lugar digno de ser vivido.

Por essas razões, meu querido Antônio Fagundes, meu caro Nico, desejo que o título que a Câmara Municipal de Porto Alegre ora te confere seja não só um motivo de satisfação, mas também de maior responsabilidade para com as coisas que tens defendido e amado. Muitas felicidades. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Convidamos todos os presentes para que, de pé, assistam à entrega do título ao nosso homenageado, Antônio Augusto Fagundes, pelo Ver. Pedro Ruas.

 

O SR. PEDRO RUAS: (Lê.) “A Câmara Municipal de Porto Alegre concede o Título de Cidadão Emérito a Antônio Augusto Fagundes pela valiosa contribuição, com seu trabalho, em prol do engrandecimento da sociedade porto-alegrense. Porto Alegre, 7 de outubro de 1986.”

 

(É feita a entrega do título. Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE: Comunicamos que o nosso homenageado recebeu inúmeras manifestações através de telegramas, entre elas, a de Aldo Fagundes e Darcy Dornelles, de Palmeira das Missões; Nilo Soares Gonçalves, Vice-Prefeito de Alegrete; Wilmar Wink de Souza, Presidente da Comissão do Carijó da Canção Gaúcha, e Hermes G. dos Santos, Secretário de Cultura, Desportos e Turismo de Palmeira das Missões.

Com a palavra, o nosso homenageado.

 

O SR. ANTÔNIO AUGUSTO FAGUNDES: Sr. Presidente, Srs. Vereadores, é praxe, quando personalidades recebem alguma honraria, a declaração de ausência de méritos para tanto. Hoje, porém, quando recebo a mais alta honraria da minha vida, quero deixar a modéstia de lado para dizer que, se contam trinta e dois anos de dedicação exclusiva a esta terra e a esta gente; que, se contam trinta e dois anos de pesquisa e divulgação da história e do folclore deste povo; que, se contam, enfim, trinta e dois anos de amor, então eu acho que tenho méritos para receber este galardão. Porque foi o amor que me trouxe aqui. Moço inquieto do Interior, recém despida a farda do Exército, saí do Alegrete como tantos moços campeando horizontes no rastro de um sonho. Porto Alegre era isto: a oportunidade, o estudo, o amanhã, com a grande vantagem de conservar intactos os laços da querência, os quais, para mim, eram, são e serão sempre sagrados. E dediquei com amor a minha vida a esta terra e a seu povo. E me fiz folclorista à sombra de Carlos Galvão Krebs, como um pequeno cientista social e eterno aluno, mas que já aprendeu com o Mestre que o folclore prova, ao estudar, uma cultura que nos entra muito mais pelo coração do que pelo cérebro, que o Homem não é o lobo do Homem, mas o irmão do Homem. Sou folclorista, assim, porque o folclore é a ciência do amor. E por amar Porto Alegre fui estudar a sua História desde quando o padre jesuíta paraguaio Roque Gonzáles, de Santa Cruz, penetrando o território gaúcho em 1626, chegou até a “grande água”, que os índios chamavam Igaí, Iguaí ou finalmente Guaíba, onde comerciantes portugueses vindos em grandes barcos comerciavam com os guaibeguaras, os indígenas da velha Guaiberenda. E logo será o porto natural a que se chegava “via monte” a receber o nome de Porto de Viamão. Com o estanciamento nestas paragens de Jerônimo de Ornellas, será chamado de Porto do Dornelles. Com a chegada dos açorianos, a partir de dezembro de l752, Porto dos Casais e logo, com São Francisco e Madre de Deus, finalmente a nova freguesia vai se chamar Porto Alegre. E com que surpresa descobri como Porto Alegre foi transformada em capital por ato de força do Governador José Marcelino de Figueiredo, que prendeu, dentro das muralhas recém erguidas e com o portão na praça que ainda hoje lembra o seu nome, os “Senadores da Câmara” (os nossos primeiros Vereadores, antecessores de V. Exas.) até que os edis mudassem a capital de Viamão para Porto Alegre...

Como humanista, como liberal e como democrata, tenho pelos políticos, em geral, e pelos Vereadores, em particular, o maior respeito e a mais sincera das admirações. Sou de uma família de políticos na atual geração. Meus cinco irmãos homens concorreram várias vezes a cargos eletivos, em distintas siglas partidárias. Darci Fagundes, meu irmão mais velho, cuja memória nesta hora reverencio, era suplente nesta Casa e nesta legislatura, e a nossa família guarda, com carinho inesquecível, gestos de grandeza de V. Exas. durante a enfermidade que vitimou aquele ente querido. De uma das minhas irmãs, nasceu aquele que, na minha opinião, é a mais fulgurante vocação política da família, uma família que, diga-se de passagem, em apenas uma geração já deu Vereadores, Vice-Prefeito, Deputado Estadual, Deputados Federais e Ministro. Eu me refiro ao nobre Vereador Pedro Luís Fagundes Ruas, jovem, culto e brilhante, a cuja inata gentileza se deve a indicação de meu nome para o título de Cidadão Emérito de Porto Alegre. E se é justo e perfeito destacar S. Exa. o Sr. Ver. Pedro Ruas neste ato, não é menos justo e perfeito destacar, como um todo, o corpo legislativo porto-alegrense, reconhecendo de público a alta representatividade da qual Porto Alegre se orgulha com sobejas razões, porque é efetivamente o seu povo, através de suas mais altas expressões, que tem assento nesta augusta Casa. Valorizo este fato enormemente porque, inexperiente em política, mas experiente de mundo, sei que a Câmara de Vereadores é a primeira trincheira da luta democrática, a que está em mais íntimo contato com o povo, a que sente mais de perto o pulsar do coração de nossa gente.

Tenho proferido conferências sobre os temas de minha especialidade em vários Legislativos Municipais, inclusive aqui, nesta Casa, e digo de coração que, cada vez que penetro os umbrais de uma Câmara de Vereadores, eu o faço com a unção religiosa de quem adentra um templo. Quando fiquei sabendo que meu nome foi submetido à consideração de V. Exas. por um Vereador de outro partido político que não o meu e que V. Exas., dignos representantes de todos os partidos, divididos em bancadas, mas unidos no amor comum a Porto Alegre e a seu povo, o aprovaram por unanimidade - raridade que me comove -, me enchi de justificado orgulho ao sentir que o meu amor por esta Cidade era retribuído. Acredito, sinceramente, que fiz algo por esta terra e por este povo, mas o título que ora recebo não encerra o meu trabalho, antes pelo contrário, me dá maior responsabilidade na mesma trincheira de sempre ou em outras que venha a conquistar. Deus há de me forças para continuar honrando o alcandorado título que no dia de hoje o povo de Porto Alegre, através de seus mais legítimos representantes, me outorga.

Em 1966, no concurso de poesias “Cidade de Porto Alegre”, alcancei honrosa classificação - segundo lugar - com a seguinte declaração de amor:

“Querência de Porto Alegre”

 

“Cheguei no trem da fronteira,/ na boca da madrugada,/ quando uma nova alvorada/ já destrancava a porteira/ e a manhã, moça faceira,/ botava rouge e carmim./ Ao vê-la tão linda assim/ fiquei olhando e querendo/ que o sol grandote nascendo/ nascesse, mesmo, para mim!/ Eu era quase um menino/ quando cheguei por aqui./ Desde o meu velho Inhanduí/ fui me criando teatino,/ meio de peão do Destino,/ redemoinhando ao lo léo./ Por copa tinha o chapéu./ Por galpão, o firmamento./ Por música, a voz do vento/ penteando as nuvens do céu./ Aprendi que, na querência,/ há pouca oportunidade./ Que é preciso ir à cidade,/ porque é lá que vive a ciência./ Não me bastava a experiência/ da campanha tão querida/ A velha e campeira lida/ só melhorava o Patrão/ - não queria morrer peão/ sem conhecer outra vida./ Não seu se será verdade/ que Deus fez todos iguais:/ vejo o caso de meus pais,/ que lutaram de verdade./ Os dois de avançada idade/ com mais filhos que perdiz/ e o Destino ainda quis/ dar-lhes a paz merecida/ e há tanto alcaide na vida/ faceiro, rico e feliz./ Por isso decidi, um dia,/ deixar o pago, que amava,/ mas que em nada me ajudava/ naquilo que eu queria./ Resolvi, sem alegria,/ campear querência maior./ Queria um mundo melhor/ para mim e para os meus/ e montei, sem um adeus,/ sabendo o rumo de cor./ Pra trás, deixei quase tudo:/ a pobreza, a ignorância,/ o sonho longe da estância/ na tristeza em que me escudo,/ a falta brutal de estudo/ que o pago teima em não ver,/ como se pudesse ser/ o Progresso algum perigo/ da tradição inimigo/ para o gaúcho temer./ À frente, estava o futuro,/ o Desafio numa prova./ À frente, uma estrada nova/ e um facho de luz, no escuro./ À frente, o rumo seguro,/ o trabalho, a educação,/ sem perder a inspiração/ dos meus campeiros matizes/ e sem contar as raízes/ da pampiana tradição./ No trem que bate-rebate,/ meu deu fome e abri o fiambre / - lingüiça, frango e matambre / e uns goles verdes de mate./ (Não sei o que, no combate / que vou travar, acharei,/ mas há uma coisa que eu sei/ porque tenho bem firmado:/ não vou negar meu passado/ e o pago que tanto amei!)/ Em Porto Alegre, afinal,/ me apeio, com alegria,/sentido a humana poesia/ da pujante Capital./ E uma alvorada estival/ com lábios cor de romã/ me recebe como irmã/ no meu passeio extasiado/ - e eu me vou embriagado,/ de encontro ao sol da manhã!/ Então, quis ver as ruas e bairros da querência,/ da nova, que escolhera e onde viera morar./ Vi tudo - cada canto! - as praças e avenidas/ e o bronze das estátuas e as gratidões erguidas/ aos vultos do passado que souberam sonhar./ O Centro, um borborinho! A rua dos Andradas,/ que da Praia já foi, mas que agora não é./ A Alfândega tem praça. Osório, um monumento./Subo então a Ladeira e contemplo um momento/ na Praça da Matriz o reduto da Fé./ Pela Duque me vou, seguindo o itinerário/ dos que ergueram do nada, outrora esta cidade./Vejo o Alto da Bronze e o Gasômetro antigo/ e a Praça da Harmonia que imagino é um abrigo/ que sobrou do passado para a posteridade./ Depois, a Independência. Talvez, a Auxiliadora./ Petrópolis e a Glória. E o Partenon, também./ Teresópolis busca um caminho que sai/ nas praias onde o sol só se lembra que vai/ mas não pode dizer, sem mentir, quando vem.../ Aqui, o Menino Deus abençoa o Guaíba/ na praia que vislumbra, ao longe Itapõa./ No outro lado, a Floresta ao poente se incendeia/e há um caminho de luz pelo Passo da Areia/ que ainda lembra as estórias do Ibicuiretã./ E vi a Cidade Baixa e lembrei o meu pago/ ouvindo um quero-quero gritar na Redenção./ Ao longe apita um trem e eu caminho nos trilhos/ vendo indústrias febris e os sociais estribilhos/ dos bairros operários, Navegantes, São João.../ ...e o Porto, de onde sai a riqueza do Estado/ (nos dedos do Guaíba, eu também vi-a-mão!)./ E penso no passado, ao pes das sesmarias,/ e recuo no Tempo, sentindo as nostalgias/ das savanas sem fim na verde solidão:/ Primeiro, o Guaibeguara / da velha Guaibe-renda / Misto de História e de Lenda/ que cruza o Tempo e não pára./ Depois, a rude coivara/ crepitou, com decisão./ Há uma nova rebelião/ nas barranças do Iguaí/ e o Jesuíta chega aqui/ catequizando o rincão./ Mas Jerônimo de Ornellas/ muito depois, também veio,/ parando xucro rodeio/ nestas paragens tão belas./ Maravilhado com elas/ aproveitou a ocasião:/ chantou raízes no chão/ e aqui ficou estanciando,/ vendo as águas se espelhando/ No ‘Porto de Viamão’./ Mais tarde, casais de Açores/ chegando também aqui,/ bordam o velho Iguaí/ com casas, jardins e flores./ Alegres, trabalhadores,/ não descansavam jamais./ Assim foram nossos pais,/ os troncos de nosso povo,/ mudando o nome de novo / para ‘Porto dos Casais’./ Muito alegre, o açorita/ vivia bem, trabalhando,/ nos intervalos dançando/ Cana-Verde e Chimarrita./ E esta cidade bonita/ ‘Porto Alegre’ foi chamada/ para sempre batizada/ entre o Guaíba e a colina/ cidade quase menina/ da Mãe de Deus abençoada./ Quando um dia os Farroupilhas/ fazendo a Glória de senha/ deixaram rastros na Azenha/ com sangue e luz pelas trilhas/ os barcos tiveram quilhas/ para o rio que os acolheu/ e o título que nasceu/ dessa página gloriosa/ de ‘Leal e Valorosa’/ Porto Alegre recebeu./ Porto Alegre, alegre porto/ onde ancorei no passado/ trazendo meu sonho alçado/ e um rumo ao destino torto./ Tu me brindaste o conforto/ de teu seio acolhedor,/ A amizade e o calor/ com que Deus soube suprir-te/ eu só posso retribuir-te/ com carreteadas de amor./ Seja mil vezes bendita/ a hora em que te busquei/ Tudo em ti eu encontrei,/ querência grande e bonita./ Até o amor que palpita/ de lá prá cá me prendeu/ e a novo lar que nasceu/ e cada ano aumentando/ os meus filhos vão chegando/ porto-alegrenses - como eu!/ Já do gaudério que eu era/ não resta quase mais nada./ Talvez apenas na estrada/ a sombra de uma tapera.../ Porém não me desespera/ a ausência sempre sentida/ da terra nunca esquecida/ cuja saudade inda trago,/ pois achei um novo pago/ nesta cidade querida./ E o pouco que sou eu devo/ a Porto Alegre e demais!/ - velho ‘Porto dos Casais’/ que contemplo enquanto escrevo./ A razão do meu enlevo/ é gratidão e amizade,/ amor, carinho e bondade/ recebidos em tal monta,/ que quando eu ‘trocar de ponta’/ levarei pra Eternidade!/ Hoje te vejo de novo,/ Porto Alegre sempre lindo./ Há um sol que eu sei! Vem surgindo/ na Glória de nosso povo./ A aurora é como um retovo/ em sangue e luz coloreada./ Revejo a vida passada/ que resumo no Presente:/ a Saudade, em teu poente,/ e a Glória, em tua alvorada!” Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Ao encerramos, queremos dizer ao Antônio Fagundes que foi um privilégio e uma honra para esta Casa poder prestar uma homenagem ao homem e sua obra, reconhecida certamente pela presença de todos que vieram até esta Sessão Solene para que pudéssemos fazer, em nome da Cidade de Porto Alegre, a homenagem a Antônio Augusto Fagundes.

A todas as autoridades que vieram, atendendo um convite da Câmara Municipal, e a todos que se fizeram presentes nosso muito obrigado.

Estão encerrados os trabalhos desta Sessão Solene.

 

(Levanta-se a Sessão às 15h50min.)

 

Sala das Sessões do Palácio Aloísio Filho, 7 de outubro de1986.

 

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